Coreia Produz Chips, Brasil Monta Celulares
Por que um país de 51 milhões virou potência tecnológica e o Brasil ficou na montagem?
5 Razões Pelas Quais a Coreia Domina Chips Enquanto o Brasil Monta Celulares
Olá!
Já se perguntou por que a Coreia do Sul produz os chips semicondutores mais avançados do mundo enquanto o Brasil continua preso na montagem de smartphones e eletrônicos para marcas estrangeiras?
A divisão manufatureira entre essas duas nações revela insights críticos sobre cadeias de suprimentos globais, soberania tecnológica e estratégia econômica. Samsung e SK Hynix da Coreia controlam quase 70% da produção global de chips de memória, gerando centenas de bilhões em receita anualmente.
Enquanto isso, o setor eletrônico do Brasil—apesar de ser o maior da América Latina—foca principalmente na montagem final, importando componentes da Ásia e agregando valor mínimo. Essa dinâmica cria uma transferência massiva de riqueza: a Coreia captura os lucros de alta margem e alta tecnologia, enquanto o Brasil se contenta com trabalho de montagem de baixa margem.
As consequências se espalham por economias inteiras—afetando tudo desde balanças comerciais até independência tecnológica e competitividade de longo prazo na era digital.
Hoje, vou analisar as 5 razões fundamentais por trás dessa hierarquia manufatureira e o que isso significa para o futuro de ambas as nações.
Vamos mergulhar fundo.
Razão 1: A Coreia investiu pesadamente em infraestrutura de P&D há décadas.
A fundação do domínio coreano em chips não foi construída da noite para o dia—foi um investimento estratégico de 40 anos em infraestrutura de pesquisa e desenvolvimento.
Nos anos 1980, o governo coreano lançou o Programa Nacional de Desenvolvimento de Semicondutores, comprometendo bilhões de dólares para construir instalações de pesquisa de classe mundial e atrair os melhores talentos globais. Eles estabeleceram o Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia (KAIST) e criaram incentivos fiscais para empresas investindo em P&D de semicondutores. Somente a Samsung agora gasta mais de $20 bilhões anualmente em P&D—mais do que o PIB inteiro de muitos países.
O Brasil, em contraste, historicamente investiu menos de 1,3% do PIB em P&D, comparado aos 4,8% da Coreia.
Essa lacuna se agrava ao longo de décadas:
Abordagem da Coreia: Parcerias governo-indústria de longo prazo focadas em tecnologias revolucionárias
Abordagem do Brasil: Contratos de montagem de curto prazo com empresas estrangeiras exigindo inovação mínima
O resultado: A Coreia possui a propriedade intelectual e processos de fabricação para chips de ponta, enquanto o Brasil depende de tecnologia importada
Quando você não investe na fundação, não pode construir o arranha-céu.
Razão 2: A Coreia construiu um ecossistema integrado de cadeia de suprimentos.
A Coreia não focou apenas na fabricação final—eles construíram um ecossistema inteiro integrado de fornecedores, fabricantes de equipamentos e indústrias de apoio.
Caminhe pelo complexo de semicondutores da Samsung em Pyeongtaek, e você encontrará centenas de fornecedores coreanos em um raio de 50 quilômetros.
Essas empresas produzem tudo desde químicos especializados até equipamentos de fabricação de precisão e sistemas de teste. Essa proximidade reduz custos, melhora o controle de qualidade e permite ciclos rápidos de inovação. Quando a Samsung precisa testar um novo design de chip, eles podem ter protótipos em dias, não meses.
A abordagem do Brasil foi fundamentalmente diferente. O país focou em atrair fabricantes estrangeiros com incentivos fiscais para estabelecer plantas de montagem final. Mas essas plantas importam 70-80% de seus componentes da Ásia:
Componentes críticos: Processadores, chips de memória, displays, sensores—todos importados
Contribuição local: Carcaças plásticas, metalurgia básica, mão de obra de montagem final
Elementos ausentes: Nenhum fornecedor doméstico para componentes de alta tecnologia, nenhum fabricante de equipamentos, nenhum fornecedor de materiais
Isso cria uma armadilha permanente de dependência onde o Brasil nunca pode subir na cadeia de valor
Razão 3: O sistema educacional da Coreia produz talentos técnicos especializados.
O sucesso da Coreia em semicondutores exigiu dezenas de milhares de engenheiros altamente especializados, e eles sistematicamente construíram a infraestrutura educacional para produzi-los.
Universidades coreanas formam entre 80 000 e 150 000 graduados em engenharia anualmente, com programas especializados em física de semicondutores, ciência de materiais e processos de fabricação. Empresas como Samsung recrutam diretamente desses programas e fornecem anos adicionais de treinamento especializado. O resultado é um pool profundo de talentos que pode inovar na vanguarda da Lei de Moore.
O sistema de educação técnica do Brasil, embora melhorando, não foi projetado para fabricação avançada de semicondutores:
Graduados em engenharia: Menos per capita que a Coreia, com especialização limitada em semicondutores
Parcerias universidade-indústria: Relacionamentos menos desenvolvidos entre universidades e empresas de tecnologia
Fuga de cérebros: Muitos dos melhores engenheiros brasileiros migram para o Vale do Silício ou Europa por melhores oportunidades
Você não pode construir uma indústria intensiva em conhecimento sem trabalhadores intensivos em conhecimento.
Razão 4: A Coreia garantiu acesso a matérias-primas críticas e equipamentos.
A fabricação avançada de semicondutores requer materiais incrivelmente puros e equipamentos de precisão que apenas algumas empresas mundiais podem produzir.
A Coreia reconheceu essa vulnerabilidade cedo e fez investimentos estratégicos para proteger suas cadeias de suprimentos. Eles investiram em empresas químicas domésticas como LG Chem para produzir materiais de alta pureza. Eles desenvolveram relacionamentos com a fabricante de equipamentos holandesa ASML (a única empresa que faz máquinas de litografia ultravioleta extrema) e fornecedores de materiais japoneses. Quando surgem tensões comerciais, a Coreia tem múltiplos fornecedores e estoques estratégicos.
O setor eletrônico do Brasil permanece completamente dependente de materiais e equipamentos importados. Quando cadeias de suprimentos globais são interrompidas—como vimos durante a COVID-19—plantas de montagem brasileiras param porque não têm alternativas domésticas:
Dependência de equipamentos: 100% dos equipamentos de fabricação de precisão importados
Dependência de materiais: 95% dos componentes eletrônicos e materiais importados
Resistência da cadeia de suprimentos: Virtualmente zero alternativas domésticas durante interrupções
Essa dependência torna o Brasil vulnerável a todos os choques da cadeia de suprimentos global.
Razão 5: O governo da Coreia forneceu capital paciente e política industrial.
Talvez mais importante, o governo da Coreia forneceu capital paciente de longo prazo e apoio consistente de política industrial por décadas.
O Banco de Desenvolvimento Coreano forneceu empréstimos com juros baixos para investimentos em semicondutores que não dariam retorno por 10-15 anos. O governo coordenou entre empresas para evitar duplicação dispendiosa e garantiu que focassem em diferentes segmentos de mercado. Quando a Samsung estava perdendo bilhões nos anos 1970 e 1980 aprendendo a fazer chips de memória, o governo preveniu aquisições estrangeiras e continuou apoiando a visão estratégica.
A política industrial do Brasil tem sido inconsistente e focada no curto prazo. Incentivos fiscais mudam com cada novo governo. Prioridades de investimento mudam baseadas em ciclos políticos ao invés de estratégia econômica de longo prazo:
Estabilidade política: A Coreia manteve apoio consistente a semicondutores por mais de 40 anos
Compromisso financeiro: Bilhões em capital paciente mesmo durante períodos de prejuízo
Coordenação estratégica: O governo ajudou empresas a evitar competição destrutiva e focar em mercados globais
Sem capital paciente e política consistente, você não pode competir em indústrias que requerem ciclos de investimento de uma década.
As implicações dessa divisão manufatureira se estendem muito além da Coreia e Brasil—elas revelam como países se posicionam na economia global para o próximo século.
A estratégia da Coreia criou soberania tecnológica e capturou as partes de maior valor das cadeias de suprimentos globais. A estratégia do Brasil criou emprego e investimento estrangeiro, mas deixou o país permanentemente dependente de tecnologia importada.
Intrigantemente, enquanto o Brasil na década de 1960 tinha renda per capita superior à da Coreia do Sul e condições iniciais aparentemente mais favoráveis para industrialização, hoje observamos uma inversão completa: a Coreia produz alguns dos bens tecnologicamente mais sofisticados do mundo enquanto o Brasil exporta principalmente commodities e produtos de montagem.
Este paradoxo de como uma economia com piores condições iniciais conseguiu realizar um catching-up tecnológico tão acelerado enquanto outra com melhores vantagens comparativas permaneceu na periferia do sistema produtivo global desafia fundamentalmente as explicações econômicas convencionais sobre desenvolvimento e aponta para mecanismos mais complexos de coordenação Estado-mercado que raramente são compreendidos em sua totalidade.
Conforme o mundo se torna cada vez mais digital, essa lacuna só aumentará a menos que o Brasil faça mudanças estratégicas fundamentais para ir além da montagem rumo à inovação e produção de tecnologias críticas.
Abraços,
Paulo Gala
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Em compensação, o Brasil apostou alto na produção de commodities, basta ver que a Embrapa é de 1973 (50 anos) enquanto a Embrapii só tem 10 anos... Sugestão: cotejar os subsídios dados ao Agro vs os subsídios dados à indústria; o crédito do agro vs o crédito para a indústria!